No Brasil, a tradição da Páscoa nos remete diretamente a troca de ovos de chocolate entre todos e um bom bacalhau na Sexta-feira Santa ou no Domingo. Em Portugal, os costumes da Páscoa são diferentes.
Na Páscoa em Portugal, os chocolates geralmente são oferecidos às crianças. Os adultos acabam por fazer pratos típicos e doces para confraternizar.
No lugar do bacalhau, o Domingo de Páscoa em Portugal é celebrado com carne vermelha – principalmente com receitas tradicionais de cabrito e borrego (o carneiro com menos de 1 ano).
A simbologia da data é direcionada especialmente aos afilhados e padrinhos.
Como é a Páscoa em Portugal e sua simbologia
Padrinhos e afilhados
Em Portugal, principalmente nas pequenas localidades, os afilhados oferecem aos seus padrinhos tradicionalmente ramos de oliveira e às madrinhas ramos de violetas no Domingo de Ramos (o domingo anterior a Páscoa).
Há algumas igrejas que, inclusive, oferecem ramos (não necessariamente de oliveira ou violetas) durante a missa para que os afilhados possam entregar depois aos padrinhos.
Atualmente, nas cidades maiores, há ainda a transformação desse hábito quando alguns afilhados oferecem aos seus padrinhos e madrinhas um pequeno vaso com planta, porém mantendo a simbologia.
No domingo seguinte, ou seja, no Domingo de Páscoa, são os padrinhos e as madrinhas que presenteiam os afilhados (crianças e adolescentes), seja com um presente (como roupas ou brinquedos), um folar (um bolo típico da Páscoa – que parece, por vezes, um pão) ou um ovo de chocolate, por exemplo.
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Folar da Páscoa
O folar é um bolo português típico da Páscoa. Ele é bastante rústico e consumido em todo o país nesta época do ano.
Cada região portuguesa possui seus próprios ingredientes e pode fazer o folar na versão doce ou salgada.
Na região de Trás-os-Montes, por exemplo, o folar mais típico é salgado e recheado com diversos tipos de carne.
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Na receita doce, muito consumida no centro de Portugal e em outras partes do país, o folar é feito com erva doce e canela. A maioria deles tem ovos cozidos introduzidos na massa ou cobrindo o folar.
Assim, o bolo/ pão simboliza o ninho e os ovos uma vida nova: os bons desejos dessa época.
No Algarve, o tipo mais famoso é o folar de Olhão.
Ele é doce, mas tem um formato diferente e não leva o ovo cozido por cima. Tem como base o açúcar e a canela, é mais úmido e se assemelha mais a um bolo, do que um pão.
A lenda do Folar
Em uma aldeia portuguesa, vivia uma jovem chamada Mariana que tinha como único desejo na vida o de casar cedo. Tanto rezou a Santa Catarina que sua vontade se realizou e logo lhe surgiram dois pretendentes: um fidalgo rico e um lavrador pobre, ambos jovens e belos.
A moça voltou a pedir ajuda a Santa Catarina para fazer a escolha certa. Enquanto estava concentrada na sua oração, bateu à porta Amaro, o lavrador pobre, a pedir-lhe uma resposta e marcando-lhe como data limite o Domingo de Ramos. Passado pouco tempo, naquele mesmo dia, apareceu o fidalgo a pedir-lhe também uma decisão. Mariana não sabia o que fazer.
Chegado o Domingo de Ramos, uma vizinha foi, muito aflita, avisar Mariana que o fidalgo e o lavrador tinham se encontrado a caminho de sua casa e que, naquele momento, travavam uma luta de morte. Mariana correu até ao lugar onde os dois se defrontavam e foi então que, depois de pedir ajuda a Santa Catarina, ela soltou o nome de Amaro, o lavrador pobre.
Na véspera do domingo de Páscoa, Mariana andava atormentada porque lhe tinham dito que o fidalgo apareceria no dia do casamento para matar Amaro. Mariana rezou a Santa Catarina e a imagem da Santa, ao que parece, lhe sorriu.
No dia seguinte, Mariana colocou flores no altar da Santa e, quando chegou a casa, verificou que, em cima da mesa, estava um grande bolo com ovos inteiros, rodeado de flores, as mesmas que ela tinha posto no altar. Correu para casa de Amaro, mas encontrou-o no caminho e este contou-lhe que também tinha recebido um bolo semelhante. Pensando ter sido ideia do fidalgo, dirigiram-se a sua casa para lhe agradecer, mas este também tinha recebido o mesmo tipo de bolo. Mariana ficou convencida de que tudo tinha sido obra de Santa Catarina.
Inicialmente chamado de folore, este bolo veio, com o tempo, a ficar conhecido como folar e tornou-se uma tradição que celebra a amizade e a reconciliação.
* Com informações do texto “Lenda do Folar da Páscoa“, incluído na Infopédia da Porto Editora
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Amêndoas na Páscoa de Portugal
A Páscoa em Portugal sempre me faz lembrar uma das minhas primas queridas, a Mariana. Ela é completamente apaixonada por amêndoas confeitadas – aquelas graúdas e bem coloridas.
Lembro das vezes em que eu ainda morava no Brasil e, quando vinha a Portugal durante as férias, ela dizia – quase em tom de súplica: “traz um pacotinho de amêndoas para mim, por favor?”.
Eu torcia para encontrar nas pequenas mercearias as “sobras” da Páscoa, pois sempre viajava a Portugal depois dessa época, entre os meses de maio e julho.
As amêndoas com cobertura de açúcar são bastante consumidas na Páscoa em Portugal.
Seu significado está vinculado ao mesmo dos ovos de Páscoa: da renovação e da fertilidade.
Algumas semanas antes da data, as amêndoas aparecem aos montes nos supermercados portugueses.
Elas podem ser oferecidas entre familiares, padrinhos e afilhados, amigos ou simplesmente fazerem parte da mesa do Domingo de Páscoa.
Depois da Páscoa, são vendidos somente os pacotes que sobraram por mais um ou dois meses.
Agora que vivo do outro lado do Oceano, aqui em Lisboa, tenho alguns endereços favoritos para comprar em qualquer altura do ano e mandar as melhores e mais fresquinhas para ela.
Portanto, já deixo a dica para quem for a Lisboa: a loja Manuel Tavares, fundada em 1860 e localizada entre as Praças do Rossio e da Figueira, sempre tem amêndoas diversas e a bons preços.
Nós também temos um querido amigo português que vive em Braga, o Duarte, e ele nos contou que na Páscoa sua mãe faz uma receita de família que consiste em torrar as amêndoas e depois banhá-las no chocolate para que possam ser consumidas no domingo por toda a família. ❤
Os ovos de Páscoa em Portugal
Os ovos de chocolate são oferecidos pelos padrinhos aos afilhados no Domingo de Páscoa, sobretudo para as crianças.
Entretanto, há poucas opções disponíveis no mercado e eles são efetivamente menos consumidos (do que habitualmente vemos no Brasil, por exemplo).
Algo que é mais tradicional relacionado aos ovos é cozinhar ovos de galinha com corantes alimentares (ou vegetais que soltem alguma cor, como a beterraba ou a cebola roxa, por exemplo) para que possa pintá-los. Então, durante o Domingo de Páscoa, com a família reunida na mesa, quebram-se estes ovos para comer.
O significado do ovo de Páscoa é o da fertilidade e da renovação. Para os cristãos, a ressurreição de Cristo.
Porém, a passagem do Inverno para a Primavera também se faz nesta época do ano. Assim, desde a antiguidade há rituais que eram feitos com ovos para que as colheitas do ano fossem boas.
Há ainda oficinas infantis ao longo desse período para que as crianças possam pintar estes ovos cozidos.
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Procissões e celebrações típicas da Semana Santa em Portugal
Outra coisa que é bastante típica da Páscoa em Portugal são as procissões durante a Semana Santa, que invocam os últimos passos de Jesus.
Já tivemos a oportunidade de assistir várias delas nesse período, de cidades grandes a vilarejos, inclusive nas ilhas dos Açores e da Madeira. É um momento de união entre os vizinhos, de convivência e também de reflexão.
Do Domingo de Ramos ao Domingo de Páscoa, vemos algumas cidades decoradas com tecidos roxos, pétalas de flores, ramos e, em algumas localidades, a abertura de espaços que compõem o caminho das procissões, com imagens religiosas em seu interior.
Entretanto, as cidades que mais recebem visitantes nesta época do ano para assistir as celebrações locais são Óbidos e Braga.
A Semana Santa de ambas são bastante expressivas para Portugal e mantém uma programação especial de missas, diversas procissões, representações teatrais e também atividades histórico-culturais sobre o período.
Compasso Pascal
Ainda bastante consistente na vida dos portugueses é o chamado Compasso Pascal – um ritual com mais de 500 anos em que pequenos grupos de religiosos saem das igrejas com uma cruz e percorrem a casa dos fiéis que vivem nos arredores para que ela seja beijada.
No Domingo de Páscoa, as famílias esperam a cruz com a porta aberta e a entrada da casa com pétalas de flores.
O padre (ou um representante religioso) passa pelas ruas tocando um sino – como sinal de que está perto de chegar – entra com a cruz, para que ela seja beijada, e benze a casa com água benta.
Nas pequenas aldeias e vilarejos, em que as pessoas se conhecem e convivem o ano todo, os religiosos também servem-se dos doces ou petiscos da Páscoa oferecido pelas famílias.
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Para muitos fiéis este é um dos momentos religiosos mais importantes do ano.
Um amigo nos contou que seus pais, quando mudavam de casa, ficavam ansiosos por este dia – para que a casa finalmente pudesse ser abençoada. Sua esposa também nos contou de uma memória de infância, quando ela e as demais crianças da família corriam entre as casas dos vizinhos para que pudessem beijar a cruz várias vezes.
Viaje a Portugal com tudo organizado
6 Comentários
Priscila,
Adoro quando chega e-mail do Cultuga. É uma delícia ler o seu texto leve e bem escrito.
Sou madrinha “profissional”: o que não tive de filhos tenho de afilhados – 14!!! Imagina fazer 14 folares na Páscoa!
Muito interessante esta lenda do folar.
Chego aí no meio de abril.
Vamos tentar nos encontrar.
Beijo grande
Deborah
Fico feliz que a nossa newsletter possa levar a você bons sentimentos :)
Realmente, seria mais fácil reuni-los para comer um folar e distribuir muitas amêndoas entre todos!
Vamos marcar aquele chá ou um cafezinho. Ficamos a espera!
Um grande beijo
Adoreeeiiii….
Oba! Que bom que gostou, Lorena! ????
Um grande abraço!
Parabéns pelo belo texto ! Estamos chegando em junho para as Festas Populares !
Muito obrigado, Antonio! ????
Que maravilha! Sempre é uma delícia curtir o mês de junho em Lisboa. ???? Aproveitem muito!
Um grande abraço!